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- Vou fechar os olhos, segura-me pela mão.
Subi a grande escada de pedra, como sempre, a chave estava na porta. Abri e entrei. No corredor da entrada que reconheci de imediato, assim como na sala de jantar lá estavam, nos quatro cantos superiores as pequenas túlipas pintadas sobre a cor de fundo verde-mar das paredes. Estou em casa...!
- Vem por aqui, percorre comigo todos os recantos. Vou lá acima, quero abrir todas as portas e janelas até ao "quarto da ponta".
A casa está em silêncio. O chão de madeira mantém o mesmo brilho como se tivesse sido acabado de encerar. Na mesa do telefone a mesma jarra de rosas brancas e goivos.
- Espera... - Olha! A imagem daquele quadro na parede que me fazia ir várias vezes, de uma ponta à outra da sala para me certificar que o mesmo olhar me seguia.
Repeti novamente esse gesto. Tudo intacto!
- A mala da roupa! Abri e, deparei-me com um masso de cartas atadas com uma fita de seda. O cheiro a alfazema espalhou-se pela sala... Voltei a fechá-la e sentei-me nela, virada para a "janela da frente". Lá estavam, os azulejos... Não tinham desenhos geométricos, mas antes formas indefinidas onde eu via um tronco bordeaux; folhas verdes; tons de laranja; um lilás quase azul clarinho, num conjunto forrado por um brilho intenso leitoso, que mais pareciam grandes flores de abóbora. A mim, pareciam-me flores de abóbora!
"Deslizei para o quarto da ponta"...
-Sempre que ouvia os seus passos suaves, fingia que dormia para melhor sentir os braços que me aconchegavam a roupa, deixando o seu roupão perto do meu rosto com o seu inconfundível perfume de mãe, voltava a sair fechando suavemente a porta. Tão suave, quanto o meu adormecer...
- Por aqui agora. Em cima da grande arca de madeira, a roupa acabada de passar a ferro.
- Vamos descer! Este segundo degrau ainda range... Sempre me denunciava de cada vez que ia à cozinha à procura de alguma guloseima. Em cima da mesa uma travessa de arroz-doce polvilhada com canela formando um xadrez.
Os meus olhos continuam fechados mas, quero ver as latadas de uvas no terraço. Quero descer cada degrau até ao jardim e observar atentamente cada vaso de malvas das mais variadas cores, coleccionadas aqui e ali, ao longo dos anos.
- Espera um pouco!... Ainda lá está! Quero andar de baloiço até me apetecer e ficar suspensa, até ouvir do alto da escada chamarem por mim.
- «Já podes abrir os olhos...»
- Estou agora do lado de fora, na beira da estrada, donde avisto um espaço vazio cercado e um portão fechado a cadeado, apenas! Ao fundo, vislumbro as árvores carregadas de frutos e as tílias que baloiçam os ramos ao sabor do vento.
Apenas as árvores continuam lá, de pé!
-As minhas memórias, também.
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Texto e fotografia/Teresinha