domingo, janeiro 24, 2010

"Fresus"

Solitário na Cidade
...procurava-te
mas tu havias desaparecido entre as esquinas
Dilui o teu rosto entre as esquinas
aquário verde das algas o teu quarto
Um pequeno lago arrancado à música
vegetal das cortinas e saudade
Mas antes estava ali riso de ti
Como "fresus" o guerreiro alado
- Beijando os cabelos de Delfia
levitante sereia
*
sentado sobre o musgo dos pianos:
tu caminhante perfume entre as esquinas
entornada nos teus olhos de aquário verde
Imaginável inverno adensa -
não para sempre doce cântico premente
*
- Todos os ramos se despem de aves
e abrigam aves consigo
*
Sou um pequeno duende
pede-me agora um desejo
Por exemplo que o teu olhar
parado vá pousar devagar sobre a cidade
numa grande nuvem sobre o mar do norte
ou nos candeeiros antigos
Projectando chuva até as luzes gritarem:
Deslumbramento...
***
"O Aquário Verde dos Dias"/António José Coutinho - Fotografia/ Maria de Jesus Pinto

quinta-feira, janeiro 14, 2010

Recadinhos de Neruda

"Morre lentamente quem não viaja
Quem não lê,
Quem não ouve música,
Quem destrói o seu amor próprio,
Quem não se deixa ajudar

Morre lentamente quem se transforma escravo do hábito,
Repetindo todos os dias o mesmo trajecto,
Quem não muda as marcas no supermercado,
não arrisca vestir uma cor nova,
não conversa com quem não conhece.

Morre lentamente quem evita uma paixão,
Quem prefere O "preto no branco"
E os "pontos nos is" a um turbilhão de emoções indomáveis,
Justamente as que resgatam brilho nos olhos,
Sorrisos e soluços, coração aos tropeços, sentimentos.

Morre lentamente quem não vira a mesa quando está infeliz no trabalho,
Quem não arrisca o certo pelo incerto atrás de um sonho,
Quem não se permite,
Uma vez na vida, fugir dos conselhos sensatos.

Morre lentamente quem passa os dias queixando-se da má sorte ou da
Chuva incessante,
Desistindo de um projecto antes de o iniciar,
não pergunta sobre um assunto que desconhece
E não respondendo quando lhe indagam o que sabe.

Evitemos a morte em doses suaves,
Recordando sempre que estar vivo exige um esforço muito maior do que o
Simples acto de respirar.
Estejamos vivos, então!"

Pablo Neruda - Fotografia/Teresinha/Hotel Convento de Alpendurada

segunda-feira, janeiro 11, 2010

Lhasa de Sela - De cara a la pared

O seu último olhar, na primeira noite de 2010, foi a deixa para que um nevão de 40 horas se abatesse sobre Montreal. Nessa cidade, a cantora Lhasa de Sela abandonava a vida após 21 meses de luta contra um cancro de mama. E a essa neve persistente, a esse manto silencioso que muitos atribuiram ao acaso, ela teria dado um significado simples e precioso: porque nada no seu caminho foi furtuito ou desperdiçado.
Tudo acabou depositado na voz, naquele timbre grave, cheio de impurezas e de luz. [...] Deu os últimos concertos em Maio na Islândia. E calou-se, não sem antes deixar um aviso aos que, como ela acreditaram em lendas e milagres.
Disse em ´El Pájaro`: "Mírenme, a la vida vuelvo ya."
Luciana Leiderfarb - (Cartaz / Jornal Expresso)

quinta-feira, janeiro 07, 2010

"Sea-gulls are flying over"

Aqui ao pé de casa...
Gaivotas de "visita" a Santo André
(Clique na imagem para ver)
"Naquela praia deserta de humanos, a graciosa gaivota aventurou-se e pousou na água, perante o olhar estupefacto de todas as suas comadres, que olhavam para ela e comentavam:
- Está doida varrida. Vai afogar-se, a pobrezinha!
Mas tão logo o disseram, viram que a corajosa gaivota vogava e vogava, qual pedacito de cortiça levado pelo vento, subindo e descendo as onduladas escadinhas que as ondas desenhavam.
Desde a criação do mundo e de todos os seres vivos, as gaivotas voavam e desciam na areia das praias, comendo nela o que o mar regurgitava: pequenos crustáceos; camarões delfins e filhotes de peixe, que ficavam presos nas poças quando a maré baixava. Por isso olhavam maravilhadas para aquela gaivota que ousara desafiar o perigo e corajosamente pousara na água.
- Ela nada, ela nada, ela não se afunda! - grasnavam estre si, ainda incrédulas .
-Se ela consegue, eu também! - disse decidida uma das mais estouvadas comadres. E se melhor o disse logo levantou voo e, planando, se aninhou entre duas ondas, que lhe deram movimento, sacudindo-a suavemente num vai-vem interminável, para cima e para baixo. E duas outras fizeram o mesmo, e mais outra e outra ainda. Depois todas as restantes se lançaram em curtos voos para aquelas brilhantes águas, que pareciam mesmo chamá-las. Na areia da praia não ficou nem uma sequer, e o mar parecia ainda mais belo, enfeitado com elas. A partir daquele dia , as gaivotas começaram a pousar e a nadar na água; logo depois aprenderam a pescar, e desde então passaram a fazer parte do imenso mar.
E só quando ele se agita e o vento ruge, quando as ondas atingem a altura de prédios e o céu troveja zangado, elas o abandoanm e voltam para terra outra vez, esperando pacientemente que passe a tormenta e regresse a calmaria.
E quando isso acontece, voltam felizes às ondas que as embalam."
*
(Texto recebido por email) - fotografia/teresinha

segunda-feira, janeiro 04, 2010

Gaivotas

Provávelmente, o MAR...
Intensamente branca
plenitude de gaivotas
que, de tão aladas, salvam
a chegada do dia,
ricas em movimentos
e, em seu voo, felizes.

Como ao meu encontro vindes,
transformo, como peixes,
minha juventude em prata.
Estremecereis só o
mar de minhas pupilas.

Johann Strauss - Fotografia/Teresinha