sábado, junho 28, 2008

quarta-feira, junho 25, 2008

Mia Couto, Connosco...

O Livro
As mãos que escrevem
[...] - Vou pensar no seu conselho. Agora tenho é que ir ter com o meu doente predilecto. Depois falamos Dona Munda.
Sidónio Rosa entra na cozinha, sentindo que o olhar de Munda o segue até à obscuridade do ventre da casa. As cortinas estão fechadas, como sempre. Suspenso sobre um banco alto, o majestoso feto secou. Há tempo que morreu mas ninguém o deita fora. «Há-de renascer», defende Munda. Sabida e consentida ilusão: a planta nunca mais viverá.
No fundo do corredor, a porta do quarto se abre, mesmo antes que o médico peça licença, e Bartolomeu, dispara a pergunta:
-Falavam de quê vocês os dois?
Assim, sem bons-dias, nem saudações. As pálpebras tremem-lhe como folhas na ventania. A doença lhe minguara o rosto e fizera crescer os olhos a ponto de não serem comtemplados. A regra humana é: o corpo todo envelhce, menos os olhos. Em Bartolomeu, até o olhar o tempo embaciara.
- Feiticeira, sim, é isso mesmo que ela é - proclama o doente.
- Não diga isso é perigoso...
- Perigosa é ela mesmo.
Bastava encostar-se numa única lembrança para fazer prova: certa vez ele lhe oferecera uma flor, um lírio selvagem de grandes pétalas brancas. Colocada em jarra, a flor parecia iluminar a sala. [...]
Venenos de Deus Remédios do Diabo / Mia Couto - Fotografia / Teresinha

sábado, junho 21, 2008

Verão

Uma janela que se abre
em pétalas de Sol

embala o amanhecer
da ternura.
E os sonhos florescem nas mimosas.

E as mãos moram em versos
e em sorrisos.

E o meu olhar de gaivota
em revoada
canta o nosso silêncio desnudado.

Silêncio Desnudado em Sol Sustenido/ Sob a Luz do Mar/Sandra Costa - Fotografia/Teresinha

terça-feira, junho 17, 2008

A Cor de um Poema

Por vezes há poemas assim:

poemas cor-de-sol
na pele inaugurada do Verão
que trazem a cor-de-mel
de uma planície em flor
que desaguam na cor-de-poente-incendiado
por um olhar de ternura...
Sandra Costa/Sob a luz do mar - fotografia/Teresinha

domingo, junho 15, 2008

O Poema Que Tomou o Lugar de uma Montanha


Ei-lo, palavra por palavra,
O poema que tomou o lugar de uma montanha.
Ele respirava no seu oxigénio,
Mesmo quando o livro jazia voltado sobre o pó da mesa.
Recordava-lhe o quanto tinha precisado
De um destino para o seu próprio rumo,
Como tinha reordenado os pinheiros,
Movido as pedras e escolhido um caminho por entre as nuvens,
Pela perspectiva que mais lhe convinha
Onde se acharia inteiro numa inexplicada inteireza:
A exacta rocha onde as suas inexatidões,
Descobririam, por fim, a vista para a qual tinham avançado,
Onde poderia deitar-se, fitando o mar lá em baixo,
E reconhecer a sua única e solitária casa.

Wallace Stevens - Fotografia/Teresinha

Uma Casa no Fim do Mundo


[...] Vinham do México profundo, onde se coziam pães em forma de caveiras e Virgens e onde o fogo de artifício era considerado a mais elevada forma de expressão artística. O espectáculo começou antes do aparecimento da primeira estrela.
[...] Nada de especial. Depois ao fim de uma pausa começaram a sério. Um foguete subiu a direito no espaço, arrastando um fio de luz prateada e florescendo purpúreo no final do arco, um lírio incandescente de cinco pontas, cada uma das pétalas rebentando numa nova flor. A multidão arrulhou de satisfação. O pai pousou a mão enorme e castanha na minha barriga e perguntou-me se estava a gostar. Fiz que sim com a cabeça.
[...] Novos lírios explodiram, vermelhos, amarelos e cor de malva, de longos caules prateados. Depois vieram as serpentes, cuspindo chamas alaranjadas, doze de cada vez, grandes curvas ondulantes, que se entrelaçavam e separavam, silvando sem parar. Seguiam-se enormes flocos de neve silenciosos, corpos cristalinos do mais puro branco, e depois uma constelação na forma da Estátua da Liberdade, de olhos azuis e lábios de rubi. Lembro-me do pescoço do meu pai, as pregas soltas da pele revestindo o grande mecanismo bojudo que lhe subia e descia na garganta, enquanto engolia a cerveja. Sempre que eu estremecia com uma detonação mais violenta ou uma dispersão de brasas coloridas que pareciam cair directamente sobre nós, o pai tranquilizava-me, garantindo-me que nada tinha a temer. Sentia no estômago e nas pernas a vibração daquela voz . Os braços esguios do meu pai, indolentemente bissectados por uma única veia, mantinham-me firme no meu lugar.
Quero falar sobre a beleza do meu pai. Bem sei que não é um tema habitual para um homem - quando falamos dos nossos pais o mais provável é que contemos histórias de coragem ou fúria colossal, ou mesmo de ternura. Mas eu quero falar sobre a simples, intacta beleza do meu pai: a poderosa simetria dos seus braços, loiros e ágeis, como se tivessem sido esculpidos em madeira crua; a suave, cadenciada graciosidade dos seus movimentos. Era um homem compacto, fisicamente digno; o proprietário de uma sala de cinema tranquilamente apaixonado pelos filmes.[...]
Michael Cunningham/Uma Casa no Fim do Mundo
«Iluminado pelos encantamentos e ansiedades que tornam a infância misteriosa [...] Uma Casa no Fim do Mundo é uma obra notável.» Laura Frost, San Francisco Reviw
(uma sugestão para levar na sua bagagem de férias)...

sexta-feira, junho 06, 2008

Planta-de-Cera

Hoya Asclepiadaceae

Mais uns (pouquinhos), graus de temperatura e, as flores abriram. Hoje! Há alguns dias que, fechadas "aguardavam" um pouco mais de calor para desabrochar...
- As hóias são plantas trepadeiras com folhas espessas e carnudas e raminhos de flores cerosas em forma de estrela. Estas flores nascem todos os anos, desde que a planta seja adulta, (normalmente ao longo do verão), esta vem sempre mais cedo, meados da Primavera. Cada raminho comporta à volta de trinta flores, e são suportadas por um ramo lenhoso que emerge de uma axila, de cores que vão do branco a um rosa pálido com o centro vermelho. - Algumas espécies são agradávelmente perfumadas. Precisam de muita luz e gostam de temperatura ambiente normal, água e, muito carinho. Resultado.
A beleza com que me surpreende todos os anos...

Planta-de-Cera e Fotografia/Teresinha

domingo, junho 01, 2008

Dia Mundial da Criança

[...]
As crianças cantam com a chuva.
Trepam aos ramos matinais das
Cerejeiras
E cantam à espera do Sol
Quando o Sol demora
Entram a cantar
Pelos olhos de Deus.
À noite cintilam.
Eugénio de Andrade - Fotografia Gustavo Tente / (Dedicado a todas as crianças)